terça-feira, 24 de julho de 2012

Bruta Flor, Maria



           Era uma mocinha do campo. Jeito simples, olhar mimoso, boca calada. Num barulho se virava e assustava, mas abria o mais puro sorriso ao ver de longe um passarinho. Era mocinha pobre, mas de mente rica. Com o pouquinho que sabia, se permitia analisar aquele mundinho que a cercava. Talvez fosse esse o segredo. Ela era simples. Uma simples Maria. Maria que a tudo via e a tudo explicava, estando certa ou errada, encontrava nas coisas um sentido.

           Até que um dia encontraram Maria. Uma moça da cidade, de boca vermelha e vestido lustroso. Não era bonita, mas o rosto corado chamava a atenção. Olhou a menina e se encantou com as coisas que dizia. Quem sabe fosse o sotaque rústico ou a mania de narrar o mundo. A moça perguntou se sabia ler, até que série havia estudado, se já ouvira falar em Shakspeare, se queria conhecer Paris, de qual cor mais gostava, se gostava de vestidos elegantes... e tantas outras perguntas que fizeram Maria balançar a cabeça, atordoada. Aos pouquinhos a menina foi "fechando a cara" e parou de tentar responder. E quando a moça, ao enfim perceber o incomodo da menina e questionar o motivo, ouviu Maria responder:
            - Pra quê?
            E pelo causo foi o suficiente. A moça de boca encarnada se levantou animada e pediu para conhecer a casa de Maria. Queria levá-la. Mostrá-la o mundo, sua casa. O sertão era pequeno demais para Maria.

           A mãe chorosa relutou. Apesar dos outros seis filhos, amava muito sua Maria. No fim das contas aceitou obrigada pela própria menina. Não que ela quisesse ir, mas a moça prometera ajudar nas despesas e também daria uma vaquinha para o leite dos menores. Não era oferta que se recusasse. Arrumou uma trouxinha com o vestido de domingo (porque a moça disse que a faria muito elegante, e aquilo era a coisa mais elegante que tinha) e pôs a sandalhinha de couro na estrada. A mãe ao longe ainda chorava, orando em silencio pelo retorno breve da filha.
          
           Duas horas de viagem e chegaram ao trem. "O primeiro de muitos" a moça rosada dizia. Teria que aprender seu nome - Prima Rosália, ela insistia. Parecia feliz com a nova conquista. Era moça solitária buscando compainha. Tinha brilho no olho que alarmava o coração. Parecia ter sofrido por amor algum dia. Mas Maria permanecia calada. Por enquanto, queria só olhar. Mais dois minutos, e teve medo.
           - Se quiser, posso voltar pra mainha?
           - Oh... - disse a moça enquanto escolhia as palavras - será um pouco complicado, mas...
           - Tudo bem.
Passou.
[...]

Nenhum comentário: